domingo, 6 de janeiro de 2013

MEMBRO FANTASMA E DOR FANTASMA - O CÉREBRO É CAPAZ DE SENTIR O QUE NÃO EXISTE MAIS?


Membro fantasma  e dor fantasma - O cérebro é capaz de sentir o que não existe mais?
O membro fantasma pode ser definido como a experiência de possuir um membro ausente, que não existe mais, mas que se comporta como se fosse um membro real. O membro fantasma é capaz de sentir as mesmas sensações do membro real. Muitos indivíduos amputados relatam ter a sensação de presença do membro extirpado, como rigidez, dor, parestesia (formigamento), calor e até a sensação de força muscular já foi relatada em algumas pesquisas. Outros relatos de pacientes que responderam a pesquisas sobre membro fantasma relatam sentirem o membro extirpado penetrar em objetos, atravessar o próprio corpo e desaparecer parte desse membro inexistente, percebendo apenas a parte distal do mesmo.

Durante muito tempo esses fatos despertaram medo nas pessoas, sendo mantido em segredo por vergonha ou medo de ser considerado louco. O medo da insanidade levou a muitos indivíduos a omitirem essas sensações de médicos e familiares. No entanto, com o passar dos anos, a psicologia evoluiu e essas hipóteses foram cedendo e deram espaço às questões fisiológicas.
A sensação fantasma pode ser explicada pela plasticidade cerebral e compreendida como uma superposição cortical de áreas vizinhas, que pode ocorrer, por exemplo, pela invasão do território representativo da face sobre o território da mão, ou até mesmo pelo desmascarar de sinapses silenciosas. 
A sensação de membro fantasma pode se manifestar nos indivíduos em diferentes situações, como por exemplo: amputação de algum membro, em casos de aferição de plexo braquial, e, até mesmo em situações de tetraplegia. Segundo estudos científicos, não são apenas pernas e braços fantasmas, há muitos casos de seios fantasmas em muitas pacientes que sofreram uma mastectomia radical (retirada da mama). Um outro registro foi um caso de apêndice fantasma onde o paciente se recusava a acreditar que o cirurgião o tinha retirado devido às dores que persistiam.
Sabendo-se que o fenômeno da sensação fantasma pode se manifestar em variadas circunstâncias, as situações mais comuns serão descritas mais detalhadamente, juntamente com algumas pesquisas realizadas em pacientes que possuem a sensação fantasma
Sabendo-se que o fenômeno da sensação fantasma pode se manifestar em variadas circunstâncias, as situações mais comuns serão descritas mais detalhadamente, juntamente com algumas pesquisas realizadas em pacientes que possuem a sensação fantasma

A sensação de ter um membro-fantasma é muito real. Muitos indivíduos relatam que, logo que perderam a perna, sentiram o impulso de sair da cama e andar, e acabaram caindo, outras pessoas com mãos fantasmas já tentaram, até mesmo, atender o telefone. Esses fatos são conseqüências da vívida sensação de um membro fantasma.
Dentre os sintomas descritos por pacientes com sensação de membro fantasma, os que se apresentam com maior freqüência são: a dor “fantasma”; dormência; queimação; câimbra; pontadas; ilusão vívida do movimento do membro fantasma, ou até mesmo, apenas a sensação de sua existência. Em casos de lesão do plexo braquial, são relatados também; estiramento da mão inteira que irradia para o cotovelo; constrição do pulso; espasmos da mão e descargas elétricas na mão e cotovelo.
Uma outra sensação de membro fantasma já observada consiste no desaparecimento de partes do membro, permanecendo apenas, a extremidade distal do membro, o que pode ser explicado com base no fato de que o modelo postural do corpo se desenvolve especialmente em contato com o mundo externo. Sendo assim, as extremidades corporais que mantêm um contato mais estreito e variado com a realidade tendem a ser mais presente que as demais. Além disso, pode ser observado o fenômeno de duplicação de membros, caso dificilmente encontrado, no qual pacientes relatam ter a vivida sensação da presença de outros dois membros, paralelamente com seus membros reais.

Dor fantasma

A dor fantasma é uma sensação dolorosa referente ao membro (ou parte dele) perdido que pode se apresentar de diversas formas tais como ardor, aperto, compressão ou até mesmo uma dor intensa e freqüente. A proporção relativa dos amputados em grupos “com dores crônicas” e “sem dores crônicas” varia de um estudo para o outro, dependendo da definição que se dá às palavras “crônicas” e “queixa”, sendo então esta dor relatada por 2 % dos pacientes, número que em outras pode variar em até  97 %.  A dor normalmente está presente na primeira semana após amputação, mas ela pode aparecer após meses ou até vários anos, estando localizada principalmente na parte distal do membro fantasma. A duração da dor fantasma varia de acordo com cada indivíduo, entretanto a dor severa persiste em apenas uma pequena fração dos amputados, na ordem de 5-10 %.
Muitos estímulos internos e externos modulam a dor fantasma, dentre  os fatores relatados pelos amputados que modificam a experiência dolorosa estão os fatores agravantes da dor, os quais são a atenção, emoção, toque no coto ou pressão, mudança de temperatura, reflexos autônomos, dor de outra origem, colocação de uma prótese. E ainda, os fatores que aliviam a dor, que são o descanso, distração, movimentos do coto, uso de uma prótese, elevação do coto, percussão ou massagem no coto. Isto prova que a experiência de dor fantasma é um resultado não de um único evento, mas da interação de vários efeitos neuronais.

Quando ocorre a desaferenciação (perda da inervação sensorial de uma região) ou a amputação de um membro as informações sensoriais periféricas se tornam inteiramente ausentes, fazendo com que neurônios no sistema nervoso central que até então recebiam informações daquela parte do corpo se tornem anormalmente hiperativos. Na dor do membro fantasma, a ausência dessas informações sensoriais faz com que neurônios nas vias nociceptivas se tornem excessivamente ativos. A superposição extensa de representações corticais que, normalmente estão separadas se relacionam com a intensidade da dor do membro, ou seja, a reorganização cortical maciça pode aumentar esse fator. Estudos apresentaram importantes evidências de que o crescimento pós-lesão e o novo padrão de conexões estabelecidas por neurônios no cérebro de amputados podem ser  possível causa do problema.

O que é real e o que é ilusão? Como diferenciar o psíquico do fisiológico e vice-versa?

O que é real e o que é ilusão? Como diferenciar o psíquico do fisiológico e vice-versa?


Durante milênios acreditava-se que as sensações em partes ausentes do corpo eram de origem psíquica, entretanto, atualmente, as explicações psíquicas foram cedendo lugar às explicações fisiológicas. 
Grande parte de nossas informações sensoriais está relacionada com áreas específicas do córtex pós-central, de modo que permitem a construção de mapas sensoriais, destacando-se aqui o mapa somato-sensorial presente no giro pós-central.  Como resultado, cada indivíduo tem uma imagem interna que é representativa do próprio ser físico, sendo esta conhecida como “imagem corporal”. 
A imagem corporal é construída de acordo com as percepções, idéias e emoções sobre o corpo e suas experiências, podendo ser, constantemente, mudada. Assim, o fantasma de uma pessoa amputada seria a reativação de um padrão perceptivo dado pelas forças emocionais. Está claro que o quadro final de um fantasma depende grandemente de fatores emocionais e da situação de vida do indivíduo. Depois da amputação, o indivíduo sofre um grande impacto psicológico e vários distúrbios emocionais surgem na adaptação física e social, o que lhe faz enfrentar uma nova situação, mas como reluta em aceitá-la, acaba tentando, inconscientemente, manter a integridade de seu corpo.
Desse modo, o membro-fantasma pode ser entendido como a interação entre o que se detecta ao nível periférico (corpo) e o que se integra ao nível central (mente), sendo criada então, a aparência final do corpo no sistema nervoso. Como o ser humano está acostumado a ter um corpo por completo, o fantasma acaba sendo a expressão de uma dificuldade de adaptação a um defeito súbito de uma parte periférica importante do corpo. Além desse fator, o córtex cerebral, que possui um mapa sensorial das partes do corpo, ainda possui uma área de representação da região amputada, o que dificulta o cessar das sensações corporais. Assim, as sensações de membro fantasma são caracterizadas por fatores psíquicos e fisiológicos, que agem, conjuntamente para expressar tal fator. 

Plasticidade - O fenômeno  de  reorganização funcional do córtex cerebral

As áreas de representação cortical, denominadas mapas corticais (e.g. homúnculo de Penfield) podem ser modificadas através da plasticidade neural a partir de alterações estruturais (adaptativas) por estímulos sensoriais, experiência, aprendizado, e após lesões cerebrais. Assim, em indivíduos que sofreram amputação ou lesão do plexo braquial é que podemos observar alterações sinápticas que podem explicar o processo de fortalecimento (desinibição) de sinapses anteriormente silenciosas. No sistema nervoso normal, muitas sinapses parecem não ser usadas, a não ser que a lesão de vias acarrete um maior uso das sinapses até então silenciosas.

Atuação da fisioterapia


Atuação da fisioterapia

A fisioterapia vai atuar desde a assistência ao ajustamento físico e emocional pela perda do membro á independência funcional. Promovendo a adaptação nos cuidados pessoais, atividades de vida diária e adaptação no uso das próteses.

Entre os objetivos específicos estão a cicatrização e redução do edema, independência na mobilidade e cuidados pessoais, manutenção e promoção de força muscular, prevenção de contraturas articulares, instrução nos cuidados com o membro residual, adaptação na deambulação com muletas nos casos de amputação de membros inferiores e extremidades. O coto saudável não deve apresentar aderências, massa muscular volumosa e deve manter a forma de cone para favorecer a colocação de prótese. Nos membros superiores os objetivo são enfaixamento do coto e posicionamento em extensão, dessensibilização, mobilização escapular, alongamento da musculatura encurtada, massagem profunda transversa e de percussão  pompagem cervical, mobilização passiva, ativa e assistida, exercícios isométricos e resistidos, eletroterapia (corrente Farádica) e técnicas específicas como Kabat. Após a protetização o tratamento deve priorizar os exercícios ativos assistidos e livres, apoio da prótese em superfícies rígidas, movimentos funcionais como ir até a boca, coçar a cabeça, escrever, desenhar e prensar objetos nos casos de próteses mioelétricas. Nos membros inferiores deve ser acrescentado o treino de marcha mesmo antes da protetização, incentivar o apoio do coto e após protetização reeducar os atos de sentar e levantar bem como subir e descer escadas e rampas.

Dra. Luciana Passos
Fisioterapeuta


Bibliografia consultada


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Giraux, P.; Sirigu, A.; Schneider F. e Dubernard JM (2001). Cortical reornization in motor córtex after graft of both hands. Nat. Neurosci., 4(7), 691-692.
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